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Foto do escritorIgor Biagioni Rodrigues

Crítica/Análise: "Vidas Passadas" (2023)

Quando se escolhe, perde-se algo...mas também se ganha.

Por Igor Biagioni Rodrigues.



Escrito e dirigido por Celine Song, "Vidas Passadas" narra a história de Nora (Greta Lee) e Hae Sung (Teo Yoo), dois amigos de infância com uma ligação profunda. No entanto, eles se separam quando a família de Nora decide deixar a Coreia do Sul e se mudar para Toronto. Duas décadas depois, os dois se reencontram em Nova York e passam por uma semana crucial, confrontando conceitos de destino, amor e as decisões que moldam uma vida.


O longa se inicia com uma cena em um bar, mostrando três pessoas. Escutamos outras pessoas debatendo quem é quem nesse triângulo, quem é o casal e quem é o amigo. Assim como elas, nós, os espectadores, só podemos nos permitir questionar as mesmas coisas. Celine Song, a diretora estreante (que já chega com dois pés na porta), faz desse que poderia ser apenas mais um filme de romance um grande debate sobre algo muito impactante em nossas vidas: as escolhas que fazemos.


A diretora e também roteirista do filme é uma dramaturga sul-coreana canadense que mora nos Estados Unidos. Ou seja, muito desse filme passa por vivências pessoais. Até que ponto? Não importa, porque escolhas que repercutem por toda a nossa vida, todos nós fazemos.


A força imagética desse filme é impressionante. Os enquadramentos e composições de cena dizem muito sobre o que está acontecendo e o que os personagens estão sentindo. Agora, vamos analisar essas cenas e falar um pouco sobre esse belíssimo longa.


A película volta vinte e quatro anos antes dessa cena inicial, e vemos duas crianças, Hae Sung e Nora (na época ainda se chamava Na Young), voltando da escola. O garoto zomba da amiga por finalmente a ter superado numa prova. Os dois se separam e cada um segue caminhos diferentes. A direção usa e abusa dessas analogias para estabelecer e contar a relação entre esses dois.




Tempo depois, enquanto suas mães conversam sobre a mudança da família de Nora para o Canadá, as crianças brincam num parque entre duas estátuas. Estátuas essas que são duas cabeças voltadas uma para outra, separadas apenas por um tronco de árvore. Esse monumento também é incompleto, cheio de partes faltando; as crianças tentam preenchê-lo e só conseguem quando cruzam as pernas uma perto da outra. Aqui, já diz muito o caminho que o filme vai trabalhar, duas pessoas que estão sempre tentando se complementar, se encontrar, mas estão sempre distantes.



Depois disso, eles vão para casa. Novamente tomam caminhos diferentes, dessa vez, em uma bifurcação. Na Young vai pela escada, seu caminho é mais difícil que o de Hae Sung, que é plano, mas o dela possui um fim claro no topo daquela escada, o de Hae Sung, não. Ele se perde naquela curva e fica caminhando sem rumo em vida.



Anos depois, eles estão novamente próximos, mas separados por uma tela. Na Young, agora Nora, está no Canadá estudando e trabalhando para alcançar seus objetivos. Enquanto isso, Hae Sung ainda está na Coreia do Sul, recentemente saiu do serviço militar e ainda mora com os pais. Ela amadureceu mais do que ele, mas isso não impede que ambos se relacionem. Mas a vida continua, e as responsabilidades cobram. Nora diz que constantemente se pega olhando passagens para Seul, mas seu trabalho é ali, e Hae Sung não tem pretensões de sair de lá. A relação dos dois vai ter que esperar mais um pouco, mas o que é esse pouco para quem esperou doze anos?


Mais doze anos se passaram, e agora seus encontros não afetam somente eles, mas seus companheiros também. A direção é esperta em mostrar Arthur, o esposo de Nora, fazendo-nos pensar que ela é submissa a ele nessa relação. Mas Celine Song foge do clichê do marido malvado que atrapalha o romance; com o passar do tempo, percebemos que ele é uma pessoa gentil, que entende todo seu papel no meio da relação de Nora e Hae Sung.


Hae Sung consegue tirar férias de seu trabalho e finalmente visita Nora. No reencontro, um espaço vazio se coloca entre eles. Atrás, há um monumento com duas pessoas de costas uma para a outra, com um grande objeto entre eles. No trem, eles estão finalmente próximos, mas uma barra de ferro os separa; suas mãos estão quase coladas uma na outra, mas novamente, não se tocam. Mais uma vez esse encontro não é um encontro, mas sim, uma separação.




Nora passa por um turbilhão de sensações devido ao fato de não se sentir uma imigrante plena. Perdida entre dois mundos - um que foi e um que é - ela escolhe o inglês, mesmo com Arthur tentando aprender coreano.


Mais para frente, durante seu passeio por Nova Iorque, os dois conversam e atrás deles conseguimos ver um carrossel. Esse brinquedo simboliza a relação dos dois até ali, um eterno movimento circular, mas que precisa de um fim, uma vez que, como eles mesmos dizem, não são mais crianças. Hae Sung é um homem que não consegue amadurecer, não por conta própria, e Nora precisa seguir seus próprios caminhos.


Após esse dia, cada um vai para seu canto. Hae Sung está no hotel, vemos que está chovendo e ele se encontra sozinho. Nora está com Arthur, para quem conta como foi encontrar o amigo após tantos anos, e como aquilo a fez se sentir mais coreana. Arthur então pergunta se ela se sentiu atraída por Hae Sung, ela diz que não. O que ambos sentiram foi um sentimento de nostalgia. Mas o marido sabe posicionar o seu ciúme, sabe da dualidade que Nora passa em ser coreana e canadense e não ser nenhuma das duas coisas. É aí que ele diz uma das frases mais impactantes do filme (na minha opinião): “Você fala enquanto dorme, e você sonha em um idioma que eu não conheço”.


Então chegamos à cena do bar. Hae Sung e Nora conversam, em coreano, sobre como poderia ter sido a vida deles se tivessem ficado juntos. Arthur entende o idioma, não muito, mas o bastante para entender o que está se passando naquela conversa, mas não interfere porque sabe que não é seu papel, porque confia em Nora, e por ser um escritor... sabe como as histórias terminam.



Na despedida, enquanto Hae Sung espera o táxi, no que parece ser a última chance dos dois, a câmera se coloca em um plano que podemos perceber uma linha no chão os separando. Hae Sung se aproxima daquela linha, quase como se estivesse disposto a rompê-la, enquanto Nora está mais afastada, porque sabe qual caminho tomar agora. Eles se abraçam e Sung pergunta se aquela ali já não é uma vida passada deles (mais um In-Yun, expressão bastante citada no filme que é utilizada para sugerir que todos podem ter se cruzado em vidas passadas, convivido em outros planos de existência), e que estão juntos em outra vida, quem ela acha que são. Ela responde que não sabe, ele também diz que não. O filme nos recorda da divisão na bifurcação, mas agora é de noite, e já não adianta pensar no “e se”, poi eles amadureceram, aquele dia acabou e cada um vai seguir o seu caminho.



Para quem só se importa com números:

Nota- 10/10.


Ficha Técnica:

Título original: Past Lives

País de Origem: Estados Unidos

Roteiro: Celine Song

Direção: Celine Song

Classificação: 12 anos

Duração: 105 minutos


Elenco:

Greta Lee como Nora

Teo Yoo como Hae Sung

John Magaro como Arthur

Won-Young Choi como pai de Nora

Yoon Ji-hye como mãe de Nora

Kristen Sieh como Heather

Hwang Seung-eon como namorada de escola do Hae

Moon Seung Ah como a jovem Nora

Leem Seung-min como o jovem Hae Sung


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