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  • Foto do escritorIuri Biagioni Rodrigues

Crítica: D. João Carioca

Atualizado: 24 de out. de 2023

Aprendendo História do Brasil e se divertindo!

Por: Iuri Biagioni Rodrigues



D. João Carioca: A corte portuguesa chega ao Brasil (1808-1821) é um quadrinho nacional lançado pela Companhia das Letras (selo Quadrinhos na Cia.), lançado em novembro de 2007, no contexto das comemorações dos 200 anos da vinda da Família Real para o Brasil (que aconteceu em 2008). Neste ano, recentemente, completaram-se 215 anos deste fato, então decidi escrever sobre esta história.


A HQ é fruto da parceira entre: Lilia Moritz Schwarcz, historiadora e antropóloga que é um dos maiores e mais importantes nomes da historiografia e antropologia brasileira, com o premiado quadrinista, cartunista e ilustrador João Spacca. Como o título sugere, a obra contará a história da vinda de D. João VI e sua corte para o Brasil, bem como os principais mudanças e eventos que ocorreram no país durante a sua estadia.


O quadrinho mostra todo o contexto social e político da Europa nos primeiros anos do século XIX que motivaram a vinda da corte para o Brasil de uma maneira bem inteligente e dinâmica. Bom, é a Lilia Schwarcz que supervisionou e fez o argumento, então não tem como ser ruim.


A história começa ainda no século XVIII, onde vemos a citação ao alvará que proibia o estabelecimento de fábricas e manufaturas no Brasil colônia. Depois, vamos para Lisboa no ano de 1807, quando vemos acontecimentos ligados às Guerras Napoleônicas, situação que foi determinante para a vinda da corte portuguesa para o Brasil.


Antes continuar falando sobre a história em quadrinhos, vamos recapitular acontecimentos que aprendemos nas aulas de História:


Napoleão Bonaparte, Imperador da França, elaborou uma medida conhecida como bloqueio continental, com o objetivo de isolar e enfraquecer política e economicamente a Inglaterra, pois proibiu países europeus de comercializar com os ingleses. Diversos países seguiram o decreto francês.


Portugal possuía boas relações com França e Inglaterra, então a adesão ou não adesão ao bloqueio geraria problemas com algum dos dois países. D. João VI era pressionado por um grupo de membros da corte para juntar-se aos franceses e por outro para aproximar-se mais dos ingleses.


Assim, as tropas napoleônicas eram uma ameaça para Portugal. Então, a corte portuguesa resolve colocar um antigo plano em ação: transferir-se para o Brasil. A intenção dessa viagem era preservar a corte e os territórios que pertenciam à Portugal. A viagem contou com apoio da Inglaterra que escoltou os navios portugueses.


A corte portuguesa saiu na madrugada do dia 29 de novembro de 1807 com mais de 50 navios (29 portugueses e 23 ingleses) e chegou no Brasil em 1808, passando primeiramente em Salvador no mês de janeiro, e, finalmente, desembarcando no Rio de Janeiro em março.



Preparando para embarcar.

Agora, voltando para D. João Carioca, vemos que o quadrinho explica e desenvolve muito bem todo esse processo. Sem poupar na quantidade de texto, Spacca constrói uma narrativa que não é cansativa. Vemos as reuniões do Príncipe Regente com seus ministros, os interesses e planos de Napoleão (aqui, inspirado no ator Christian Clavier), o papel dos ministros portugueses nas negociações com França e Inglaterra e toda articulação e preparação para a viagem. Algumas vinhetas representam mapas que nos ajudam a entender melhor. Depois vemos as principais mudanças que D. João: Brasil como sede do aparato político e administrativo de Portugal, abertura dos portos às noções amigas (principalmente, a Inglaterra) que contribuiu para a expansão da economia brasileira, construção da Casa da Moeda, Criação do Banco do Brasil, Jardim Botânico, Teatro Municipal, instalação da Imprensa Régia, Academia Real Militar, Academia Real de Belas Artes e da Biblioteca Real. Temos também a elevação do Brasil a Reino Unido de Portugal e Algarves (1815). Além disso, ocorreram melhorias urbanas como novos bairros, ruas mais largas, calçamento, etc.


Um pouco da participação de Napoleão na trama.

O quadrinho também mostra as contradições e problemas como: a falta de estrutura do Rio de Janeiro para receber uma grande quantidade de pessoas, os conflitos e diferenças entre brasileiros e portugueses, manutenção da escravidão, a vida das pessoas que ficaram em Portugal e tiveram que enfrentar os franceses e lidar com a presença de ingleses como o almirante inglês Beresford, que comandava o país e era odiado pela população.


Outro mérito da HQ é mostrar diferentes pontos de vista sobre o mesmo fato, assim temos contradições que geram o humor. Aliás, o humor aqui é bem inteligente e com senso crítico. Ele é notado nas falas dos personagens, nas suas expressões e nas já citadas contradições de narrativas.



A história também mostra, rapidamente, as campanhas militares empreendidas por D. João como invasão da Guiana Francesa e a anexação da Cisplatina (atual Uruguai). A Revolução Pernambucana, movimento de caráter separatista e republicano ocorrido em 1817 aparece brevemente na trama.


A anexação da CIsplatina (atual Uruguai)

Os problemas de relacionamento entre D. João (aqui, uma espécie de precursor do famoso "jeitinho brasileiro") e sua esposa Carlota Joaquina (aqui, segundo Spacca, uma soma de Medeia, Lady Macbeth, Frida Kahlo, Dick Vigarista e Didi dos Trapalhões) são retratados de uma maneira engraçada e divertida.


Temos também um pouco do Congresso de Viena (conferência entre líderes das grandes potências europeias que ocorreu entre novembro de 1814 e junho de 1815, após a derrota da França, cuja finalidade era a de redesenhar o mapa político do continente europeu e restaurar as monarquias depostas por Napoleão), juventude de D. Pedro I e seu casamento com Dona Leopoldina. Por fim, vemos o retorno de D. João para Portugal num contexto em que Portugal passava por problemas políticos, econômicos e sociais. Os ideais liberais se espalham entre os portugueses e, em 1820, ocorre a Revolução Liberal do Porto, que exige o retorno do Rei D. João VI e a formação de uma assembleia constituinte (as Cortes). O Rei regressa a Portugal em 1821. A HQ vai até este ponto.


D. Pedro I e Leopoldina


A arte de Spacca merece destaque, porque suas composições de página são bem dinâmicas e versáteis, os enquadramentos e formatos de quadro são criativos, os cenários são bem detalhados (algumas vinhetas são inspiradas em pinturas de grandes artistas como Debret, Rugendas, Failutti, entre outros), as cores são vivas e valorizam a arte, os desenhos cartunescos funcionam perfeitamente, pois contribuem na construção da personalidade dos personagens e são muito expressivos, os figurinos de todos os personagens e figurantes são frutos de uma pesquisa detalhada e, por isso, são extremamente fiéis ao vestuário século XIX. As naus, coches, carruagens, armas e construções também são muito detalhadas e fiéis ao período histórico retratado. Tudo foi fruto de pesquisas, estudos, visitas a museus e fotografias de locais que aparecem na obra.


Finalizando, D. João Carioca: A corte portuguesa chega ao Brasil (1808-1821), é um quadrinho muito bem feito, gostoso de ler, tem um ótimo trabalho de arte, é muito completo nas suas explicações e na retratação do período histórico abordado. Enfim, é um ótimo jeito de aprender História do Brasil e se divertir ao mesmo tempo!


PS: O quadrinho foi adaptado para uma animação produzida pelo canal Futura. Você pode assistir clicando aqui.


Para quem só se importa com números:

Nota: 8/10


Dados da HQ:

Pesquisa, supervisão e argumento: Lilia Moritz Schwarcz

Pesquisa, roteiro e arte: João Spacca

Editora: Companhia das Letras (selo Quadrinhos na Cia.)

Número de páginas: 96




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